Sabe aquele momento em que você se depara com um velho conhecido seu, quando há mútuo reconhecimento, mas ninguém ousa tomar a iniciativa do cumprimento? Pois é. Esse fingir não reconhecer só ocorre quando as partes se sentem constrangidas. Quando me deparei com o Pastor Sydnelson, fiquei por demais desconcertado porque acabara de sair do motel e caminhava a passos largos de mão dada com minha parceira para longe dali. O Pastor certamente ficou sem-graça por estar dirigindo um Corolla e por ter deparado comigo em situação relativamente degradante, deixando um motelzinho de quinta em dia promocional.
O primeiro carro de meu agora próspero conhecido foi um gol mil, desses quadradões que bem parecem uma caixinha de fósforo. Eu trabalhava em um cursinho preparatório na cidade de Nilo. Meu patrão era dono de um imóvel que o Pastor locava para promover cultos. Muitas vezes ajudei a empurrar aquele calhambeque... O sacerdote era grato e bonachão. Não só me pagava uma cerveja como também entornava um copo da gelada. Parecia ingerir um remédio; tomava de uma talagada só. Justificava a atitude pouco protestante com a passagem bíblica em que JC vertia água em vinho.
Certa tarde, Pastor Sydnelson chegou pilotando um monza em muito boas condições. Não se vestia maltrapilho. Calça, sapatos e camisa social. Nem parecia aquele molambo que pisava em sandálias de borracha. Indaguei sobre o automóvel. Ele contou como conseguiu: "Cheguei atrasado no culto. O carro deu "probrema".. Com a mão lavada de graxa, todo suado eu falei assim: 'Irmãos, olha a mão do pastor! O carro do pastor é velho; faz ele se atrasar pros culto. O pastor precisa de um carro novo pra tocar a obra de Deus. Aleluia!' Foi um fervo. Trataram de formar um caixinha. Um fiel mecânico disse que passava o golzinho pra frente. Em uma semana peguei esse monza. É Deus agindo". Pelo visto Deus atuou mais e mais. Não parou quieto, não poupou esforço para dar a Sydnelson uma máquina importada.
Tempos depois tive mais notícias dele. Ampliou sua casa de oração e arrebanhou grande quantidade de fiéis. Largara a primeira mulher com quem era amancebado para se casar com uma linda ovelhinha, muito mais jovem. Eu pensei no discurso que o Clérigo protestante poderia ter usado para trocar de companheira: "Irmãos não censurem minha atitude. Preciso trocar de mulher porque a minha já está um tanto gasta..."
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